31.8.07

Sentimentos Repassados [Delírios de Outrora]

Quando acordei permanecia intacto. Sabia que nada havia mudado. Estava embaixo do céu noturno que me conduzira ao delírio. Os vaga-lumes brilhavam ao meu alcance como faíscas queimando a visão. O sussurro ainda permanecia a me estremecer. Havia tentado mais uma vez sonhar, mas não conseguira. Estava por perder meu maior desejo, continuando a viver como na infância, onde a pureza dos desejos não via maldade. Coloquei-me a lutar, mas, por sorte, esquivava-me de mim mesmo. Como um velho que já sem forças, caí. E meu rio congelado foi aos poucos se desfazendo, e assim pude ver além do que me mostrara a realidade. Então, adormeci.

Por trás dos rostos, via os olhos em direção ao chão. E os outros a lhe fitar o corpo, enquanto o brilho resplandecia em primeiro plano, na escuridão. E, além disso, pude ver as linhas que faziam a face se levantar tão facilmente que desacreditava e me afundava nas imagens. Falsificaram-me a verdade e todas as bocas que permaneciam caladas, agora seguiam em direção à carne. Dos gritos que partiram de mim só ouviram sussurros. Mas, à noite, as luzes nos enganam e por acaso vemos um mundo distorcido pela volúpia.

Traí-me ao ver a imagem no espelho. Pois sabia que o outro eu não era o mesmo que o olhava. A imagem que se reflete não reproduz o que vejo pensando. Sendo assim, só me via como os outros e nunca saberia me entender, por não saber olhar-me nos olhos. Meu delírio de outrora saltou os óbices abstratos de minha mente vindo a fomentar minha lucidez. Minhas águas novamente congelaram com o despertar. Sentia falta da leveza de meu corpo e afundei-me no vazio.

N. Lopes


Um comentário:

  1. Um dia verá sua imagem no espelho e ainda não te encontrarás, mas um dia esta imagem em olhos negros se revelará, POETA.

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